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Por Marcos Kisil* Acredito piamente no que me foi ensinado pelos meus pais sobre a […]
Acredito piamente no que me foi ensinado pelos meus pais sobre a parábola do Bom Samaritano, que ajudou a quem precisava quando o próximo estava em sofrimento. Um anônimo deu apoio, carinho, e recursos para um outro anônimo que necessitava remediar suas feridas. Este anonimato de um doador e de um receptor foi que sempre me motivou, tanto na vida pessoal, como profissional.
Se o Bom Samaritano usou da misericórdia com o seu semelhante, este semelhante anônimo recebeu a oportunidade de sobreviver e enfrentar as suas adversidades pessoais, e provavelmente fazer uso de sua própria experiencia para valorizar a própria misericórdia para com os outros anônimos que encontrou ao longo de sua vida.
Trabalhei para ser esse anônimo.
A palavra misericórdia parece que nesse momento é uma palavra quase que ausente quando diferentes sociedades vivem um período de guerras e violências contra qualquer indivíduo, família ou comunidades, afetando especialmente crianças e mulheres, que não encontram um mínimo de esperança em suas vidas. Misericórdia não é ausente de uma sociedade ou país.
Misericórdia deveria ser intrínseco ao individuo, mas parece estar ausente do discurso e da prática de líderes detentores de poder numa sociedade ou país. Parece que está ausente de maneira global ora por atender interesses econômicos, ora tentando acabar com etnias, ora perseguindo aqueles que incomodam esses detentores de poder.
Essa mesma misericórdia, evoluída para o conceito de filantropia estratégica, fez com que nos dias de hoje haja um contingente de líderes, seja como doadores ou
receptores dessas doações, que através de ações estrategicamente organizadas, atuam como um farol de esperança para atender às necessidades da sociedade, e de indivíduos no difícil contexto de hoje.
Este foi o espaço em que tive o privilégio de desenvolver minha atuação pessoal e profissional nos últimos quase 50 anos.
Nesse sentido tenho que agradecer a organizações que me permitiram a ser otimista e acreditar que a paz é possível, e cada ser humano possa ter a oportunidade de desenvolver seus talentos em benefício da sua sociedade, e da humanidade.
Agradeço a Fundação Kellogg, onde como Diretor para a América Latina e Caribe, atuei para trazer a sociedade civil, e suas organizações, à voltarem a ser agentes da cidadania depois do período nefasto dos regimes militares na região. Com programas em saúde, educação, desenvolvimento rural, com atenção para com as crianças e famílias, demos nossa contribuição para que oportunidades fossem aproveitadas e modelos de projetos se tornassem políticas públicas.
Agradeço ao IDIS, organização a quem dediquei o conhecimento e experiencia para motivar, provocar, planejar, organizar e avaliar centenas de filantropos e suas organizações como transformadoras da realidade. E um agradecimento especial às organizações que me receberam em seus Conselhos, ou como consultor e voluntário, seja para sua criação, ou para suas recriações. Agradeço ao GIFE, WINGS, Latimpacto, Resource Alliance, Alliance Magazine, ao Instituto Ayrton Senna, Instituto Gol de Letra, Fundação José Luiz Setúbal, Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Museu Judaíco de São Paulo, SAVE, a Escola Aberta do Terceiro Setor, e outras organizações da sociedade civil, que buscaram, e buscam, remediar as feridas de uma sociedade injusta, desigual, e criadora de um fosso cada vez maior entre aqueles que tem e aqueles que não tem acesso aos mesmos direitos humanos.
E essas organizações da sociedade civil, ao longo dos anos felizmente se multiplicaram pelo país e pela região– como associações, fundações, movimentos sociais – desempenhando papéis fundamentais na construção e consolidação de sociedades mais justas e democráticas.
Aprendi com essas organizações e disseminei o que aprendi. Entre esses aprendizados gostaria de destacar:
• A articulação que realizam da participação cidadã, criando espaços de diálogo em que qualquer pessoa pode exercer sua cidadania ao debater, decidir e agir em torno de interesses coletivos, incluindo a mobilização para ampliar o protagonismo na formulação e no acompanhamento de políticas públicas.
• O controle social na prestação de contas e responsabilização que exercem ao monitorar, acompanhar e fiscalizar a atuação do Estado e de empresas, em seus territórios, denunciando irregularidades e propondo melhorias. Para tanto atuam de maneira que sirvam como exemplo de transparência e seriedade com os seus próprios bens e recursos. E assim, ganham credibilidade aos olhos de toda a sociedade.
• A promoção de direitos e inclusão de grupos historicamente marginalizados (pessoas com deficiência, povos tradicionais, segregados pela cor ou etnia, ou por suas orientações sexuais, entre outros), lutando por políticas e práticas que garantam igualdade de oportunidades.
• A busca de inovação e solução de problemas, experimentando metodologias e abordagens criativas para questões como saúde, educação, meio ambiente e cultura, gerando modelos que podem ser escalados ou adotados por políticas públicas.
• O diálogo entre setores e organizações públicas ou privadas, empresas ou organizações da sociedade civil em áreas que parecem que foram abandonados e não são atendidas nem pelo governo, nem pelo mercados.
Para tanto, organizações da sociedade civil atuam como mediadoras para estabelecer pontes e muitas vezes, parcerias público-privadas e cooperação nacional e internacional, contribuindo para decisões mais equilibradas e com maior legitimidade.
• Essas organizações são construtoras de capital social, fortalecendo laços de confiança e colaboração dentro e fora das comunidades, essenciais para a coesão social. Valorizam e estimulam a solidariedade e altruísmo, formando redes de apoio que se estendem além das fronteiras organizacionais.
Em suma, as organizações da sociedade civil são canais imprescindíveis para que a voz dos diversos segmentos sociais seja ouvida pelo poder público e privado, e
que sejam responsabilizados e para que se desenvolvam soluções inclusivas e eficazes. Elas fortalecem a democracia ao expandir a participação, promover transparência, defender direitos e fomentar a cooperação em prol do bem comum.
Também aprendi muito ao conviver e atuar em organizações da sociedade civil sobre a importância de seus líderes, que seguramente muitos se encontram neste
recinto.
A liderança nas organizações da sociedade civil é um fator-chave para que elas cumpram sua missão de maneira eficaz, sustentável e com impacto social. Eis por que essa liderança é tão importante, e o que aprendi com ela:
• Atuam na definição de visão e direção estratégica. Líderes inspirados articulam uma visão clara do futuro que guia toda a organização. Isso ajuda a alinhar esforços, estabelecer prioridades e assegurar que projetos e ações estejam sempre conectados ao propósito maior.
• Mobilizam pessoas, corações e mentes, e especialmente recursos, atraindo e engajando filantropos, voluntários, membros de órgãos públicos e do mundo empresarial, e também da universidade ou outras organizações da sociedade civil. A habilidade de convencer e motivar faz com que mais gente queira se envolver e aportar tempo, conhecimento ou recursos financeiros.
• Fortalecem a governança e a transparência de suas organizações. Líderes com compromisso ético estimulam processos de governança sólidos (conselhos, comitês, prestação de contas), garantindo que as tomadas de decisão sejam coletivas, transparentes e responsáveis — o que aumenta a credibilidade da OSC junto à sociedade.
• Usam instrumentos de inovação e adaptabilidade. Em um mundo em constante mudança, lideranças proativas identificam oportunidades de inovação — novos métodos, parcerias ou tecnologias — e conduzem a organização na adaptação de estratégias para responder a demandas emergentes.
• Gestão de crises e resiliência. Quando surgem desafios (corte de recursos, crises políticas, pandemias etc.), líderes resilientes mantêm o foco, conduzem a equipe na busca por soluções criativas e asseguram que a OSC se recupere e até saia fortalecida.
• Constroem redes e alianças. A liderança transcende os muros da própria OSC: bons líderes sabem articular redes colaborativas, fomentando coalizões que ampliam o alcance e o impacto de causas comuns.
Em suma, a liderança é o motor que transforma intenções em resultados concretos. Sem ela, mesmo as melhores ideias podem ficar no papel; com ela, uma OSC é capaz de inspirar, mobilizar e gerar mudanças sociais duradouras.
E por último gostaria de enfatizar um tipo particular de liderança que encontrei ao longo de minha trajetória pessoal e profissional: a liderança servidora, ou servant
leadership, onde o líder coloca o foco principal no crescimento, bem-estar e desenvolvimento das pessoas e da comunidade ao redor, em vez de exercitar a autoridade ou o poder de uma posição de chefia. Sua importância se manifesta em diversos níveis:
• Empoderamento da equipe. A principal, o líder servidor apoia ativamente o desenvolvimento de competências dos colaboradores, proporcionando recursos, feedbacks construtivos e autonomia. Isso gera maior senso de pertencimento e responsabilidade, pois as pessoas sentem-se valorizadas e capazes de tomar decisões.
Que por sua vez, leva a um:
• Clima de confiança e colaboração. Ao priorizar as necessidades dos outros, o líder cria um ambiente de respeito mútuo, a confiança cresce quando a equipe percebe que o líder “está a serviço” e não apenas “no comando”, estimulando a cooperação e o compartilhamento de ideias. E assim ocorre naturalmente.
• Maior engajamento e satisfação, onde as organizações com líderes servidores tendem a ter índices mais altos de motivação e retenção, já que seus membros percebem um propósito maior e sentem-se apoiados em seus objetivos pessoais e profissionais. Esse engajamento se reflete em produtividade e qualidade do trabalho.
E tudo isso devido a um processo de:
• Tomada de decisão mais humana, gerando impactos sociais e emocionais, não apenas metas financeiras ou de prazo. Isso costuma resultar em soluções mais sustentáveis e éticas.
O que propicia:
• Desenvolvimento de cultura de serviço e solidariedade na organização. O exemplo do líder contagia a organização: colegas começam a adotar uma postura de ajudar uns aos outros e de se envolver com a comunidade externa. Projetos sociais ou de voluntariado ganham força, ampliando o impacto positivo da instituição.
Com isso se torna possível que as organizações ganhem:
• Resiliência e adaptabilidade para enfrentar momentos de crise, onde as equipes guiadas por líderes servidores tendem a se unir mais rapidamente para apoiar uns aos outros, devido a ênfase no bem-estar coletivo fortalecendo a capacidade de enfrentar desafios e encontrar soluções criativas.
Em resumo, a liderança servidora transforma estruturas hierárquicas em ambientes mais horizontais e humanos, onde as pessoas são estimuladas a crescer, colaborar e inovar. Isso não só fortalece a coesão interna como também amplifica o impacto social da organização.
Assim, ao longo de minha vida pessoal e profissional encontrei homens e mulheres que me fizeram ser otimista sobre a possibilidade de evitar, ou acabar com a miséria humana. Dediquei-me a entender líderes servidores dispostos a ajudar pessoas, famílias, e empresas, tornando-se filantropos estratégicos ou receptores de doações, para o surgimento, crescimento, desenvolvimento e sustentabilidade da sociedade civil. Tive oportunidade de vê-los ocupar espaços como pontes entre o ter e não ter, e o ser e não ser numa sociedade profundamente desequilibrada nas oportunidades oferecidas aos seus membros.
E nesse caminho, essas organizações, e suas lideranças, avançaram naquilo que líderes do governos e do mercado estão muitas vezes despreparados para agir.
Sinto-me honrado em ser homenageado em uma solenidade em que premia organizações da sociedade civil. Creio que representam o coração pulsátil da vida de uma sociedade mais justa, responsável, solidária e sustentável para tornar o nosso planeta um lar para todos.
Muito obrigado!
Palavras proferidas pelo professor Marcos Kisil durante homenagem que recebeu no evento Melhores ONGs Paulistas, em junho/25.
*Professor Titular Sênior do Instituto de Estudos Avançados da USP, VicePresidente do Consocial/FIESP, Consultor Sênior da Fundação José Luiz Setúbal, ex- Diretor da W.K.Kellogg Foundation para América Latina e Caribe, fundador e ex-Presidente do Instituto de Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), ex-Presidente do Conselho do GIFE.